terça-feira, 31 de maio de 2016

MENÇÃO HONROSA no concurso da Estância da Poesia Crioula, de Porto Alegre

UM CHASQUE A JOÃO SIMÕES



Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
É João Simões Lopes neto que o verso exalta, aprecia.
Nasceu na pampa bravia no tempo das sesmarias.
Sopre auroras, minuano! Perpassando horizontes.
Ao vertedouro das fontes do nativismo de antanho...
Que pastoreio, arrebanho: as lendas, causos e aprontes.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Pelotense das charqueadas, mal e mal um gurizito,
ao perder a mãe, aflito, saiu do pago em conflitos.
Capital - Rio de Janeiro – estudou em medicina.
Mas voltou de relancina, pois que mui adoentado...
Surgia um novel alçado ao tropear pela campina.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Soluço, sorriso e manhas transcritas do cotidiano.
Mirava a prenda, o paisano; causos moços, veteranos.
Fez coleta de cantigas: trova, humor e patriotismo.
Trazendo ao regionalismo as nações e suas crenças...
Origens e diferenças geradoras do gauchismo.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Essência de berço e vida – deste amor pelo torrão.
Centenária tradição a pulsar nos corações.
Do casório com Francisca, só uma filha, adotada.
‘Dona Velha’ apelidada – foi além das primaveras...
Que inda juntou quimeras, também hoje consagradas.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Foi peão, foi capitão da então Guarda Nacional.
Proprietário comercial junto às artes culturais.
Com campeiro linguajar, num portunhol fronteirense,
o já escritor rio-grandense lançou Cancioneiro Guasca...
O povo meteu-lhe tasca: que bem pouco lhe pertence.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Nasceu Contos Gauchescos! E o Blau Nunes narra a obra.
Personagem que desdobra heroísmos e soçobras.
No livro Lendas do Sul, Negrinho do Pastoreio.
Depois narra, de permeio, a história de São Sepé...
E a Casa de M’bororé, que do Mato Grosso veio.

Há uma alma inquieta na vida de um bom poeta.
Lançou Casos do Romualdo – e ali Simões faz a gira.
Tem um quê de curupira nestes causos de mentiras.
Fez teatro o professor – e abriu tabacaria:
Fumos “Diabo” em ousadia – as outras com nome santo...
Certo estava, mas, no entanto, perdeu toda a freguesia.

Tarde fria! Nosso poeta liberou a alma inquieta.
Deixaste vivo um legado, ó João Simões Lopes Neto.
És na estância o predileto - dos mentores mais seletos.
Extraiu prata da terra nesta terrena aventura.
E semeou literatura garimpando nossa história...
Perpetuaste na memória... nossas riquezas - cultura!

segunda-feira, 7 de março de 2016

Ao Dia da Mulher... consciência maior aos homens



CORAÇÃO DE GALINHA

Houve um tempo há pouco tempo, celular não existia.
Conversar - rodar o mate - era muito mais frequente.
Foi num destes ambientes que disseram pra um menino:
- Para você, pequenino, vou assar algo especial!
É o coração de uma ave criada nos cativeiros.
Noutros tempos a galinha só se via nos terreiros.

  Foi depois, já degustado, a pergunta formulada.
- Papai! Por que é tão bom o coração de galinha?
Respondeu, pondo farinha, no pratinho do inocente:
- São importantes pra gente! Põe os ovos, um por dia!
 Quando choca, se arrepia; cria os pintos, cuidadosa.
E por ser boa a galinha, a sua carne é gostosa.

Como águas passageiras, segue a vida compassada.
Este filho, agora pai, tinha urbano laborar.
Mantinha, em seu novo lar, modernismos e bazares.
Internet, celulares, num consumismo selvagem.
Neste andar da carruagem, de criador esmerado,
dois empregos – longas horas – em casa sempre cansado.

E doutra vez, sem escola, levou o filho aos avós.
Na mochila um videogame, dois ipad e um robô.
Lá no sítio do vovô: - Poderiam lo cuidar?
E à noite, tem jantar? Um churrasquinho talvez?
Foi assim que se refez, numa tarde em calmaria,
O ritual para o preparo desta simples iguaria.

O vovô foi explicando ao netinho que ajudava:
- Corte a ponta de gordura do coração da galinha.
Antes do sal de cozinha ponha as ervas e azeite.
Alguns adicionam leite, porém tudo é complemento...
Pediu vez, neste momento: - Mas por que ele é tão bom?
Entre as carnes de segunda não se inclui o coração?

No terreiro, um carijó, pediu milho em cantorias.
E as galinhas se juntaram cacarejando em coretos.
Aprendeu lascar gravetos, fez o fogo e coisas mais.
À noite, já com seus pais, uniram-se gerações.
E o piazito viu lições, naquela simplicidade,
vislumbrando fantasias – mais amor e liberdade.

Retornando para casa – no silêncio - adormeceu.
Foi na cama, em oração, o pai ouviu, comovido:
- Deus! Atenda meu pedido! Que termine este castigo
de não ter os pais comigo. De senti-los a meu lado!
Disse ainda, emocionado: doava tudo que tinha
para a vida ter sabor... de um coração de galinha!

domingo, 20 de setembro de 2015

Poesia reverenciando a valentia, não somente dos gaúchos, mas também das prendas!



Por Otavio Reichert

 Peleia

Não vivi o antigamente, histórias de pelejadas.
Que falam de homens valentes, algumas até inventadas.
Num fandango, há pouco tempo, assisti lá no interior;
e crianças, saiam de perto, pra não sonhar com o pavor.

Eram oito os seguranças os guardas da tal festança
e três irmãos, araganos, com as prendas ali na dança.
Farreavam em gritos, relinchos, quais potros em liberdade,
quiseram prender um deles, achando que era maldade.

Aquele bando de praças escoltou o seu Marino!
E batendo - assim de graça - pois nem reagiu o teatino...
Brigaram três contra oito, o fandango tinha parado:
durou pouquito o furdunço, o trio já quase algemado.

Covarde fica bem macho, nas folgas e na ocasião.
O cacetete borracha comeu o lombo do irmão.
E querendo bater de novo, levantou mais uma vez,
mas alguém segurou o taco e veio em defesa dos três.
                                                                         
O polícia olhou pra trás - quem fizera o desatino.
Num relance, assim num zás, perdeu o taco e o tino.
O salão que era silêncio barulhou com aquela luta:
a mulher daquele quera tinha a arma do recruta.

O guarda se foi pra cima, achando que ali vencia!
Amigos segurem a rima, que inté a gaita gemia.
Ela jogou o cacete fora, decerto não quis usar.
E ele agarrou uma cadeira, com ganas de até matar.

A prenda saltou de salto e a cadeira se espatifou.
Pegou ela, dum costado, uma ripa que se soltou.
O milico ainda agachado, e ninguém quis se meter,
levou na testa a ripada que esguichou sangue a correr.

As outras duas pinguanchas vieram juntas roncando.
 Juntaram-se com a primeira; agora já seis peleando!
Uma delas com um facão, mas levou uma bordoada,
frouxaram as forças no ato e já logo foi desarmada.

O marido da pinguancha, de imediato fez socorro!
Se achegou pedindo cancha; no braço levou o estouro!
O facão meio sem fio, mal cortou, mas quebrou osso,
pendeu o membro ferido; urrou de dor no alvoroço.

E atrapalhava-lhe o braço, balançando ao movimento.
Soltou o cinto pra espaço, vejam só qual era o intento.
Meteu a mão nas bombachas, guaiaca chinchou de novo:
e daquele jeito maneado, deu um pealo num corcovo.

O praça caiu de esguelha, mas puxou d’arma e deu tiro.
Errou... e quebrou uma telha, que veio fazendo giro.
Assim que o caco caiu, lascou um chute bicudo
que em cheio acertou no praça, quebrando nariz e tudo.

Mais tarde chegou reforço e reverteram a situação.
Os que vieram, muito esforço, pra juntar os outros no chão.
Dos casais, cinco prenderam, nove leitos na UTI,
dos nove, oito morreram, mas o nono... ESTÁ AQUI!